quinta-feira, 26 de março de 2009

A Transcendência do Avivamento

Disse-lhe o SENHOR: Vai, volta ao teu caminho para o deserto de Damasco e, em chegando lá, unge a Hazael rei sobre a Síria. A Jeú, filho de Ninsi, ungirás rei sobre Israel e também Eliseu, filho de Safate, de Abel-Meolá, ungirás profeta em teu lugar. Quem escapar à espada de Hazael, Jeú o matará; quem escapar à espada de Jeú, Eliseu o matará. Também conservei em Israel sete mil, todos os joelhos que não se dobraram a Baal, e toda boca que o não beijou” (1Reis 19.15-16)

Ficamos fascinados ao ouvirmos sobre os reavivamentos que ocorreram ao longo da história do povo de Deus e acabamos por sonhar com esse poderoso derramar da vida de Deus sobre a nossa própria geração. Nessa expectativa arrebatadora, começamos a idealizar modelos configurados por nossas próprias mentes e ideais. O problema está em buscar e sonhar com algo que tem mais a ver com a nossa visão limitada do que propriamente com aquilo que Deus quer realizar. Creio piamente que o que Deus está por fazer ultrapassa qualquer expectativa humana e por isso, sem qualquer presunção, gostaria de refletir sobre a transcendência do avivamento.

O Deus transcendente

A natureza do avivamento tem a ver com a natureza de Deus, pois se trata do derramar da Sua própria vida que não pode ser medida ou mensurada nos padrões humanos, ainda que, para efeitos didáticos, tentemos compará-la ao universo, aos mares etc. Falar sobre Deus é falar de alguém que está acima da compreensão de qualquer ser já criado, portanto, não podemos achar que a nossa teologia aborda a divindade em todos os Seus aspectos e profundidades. Quantos atributos Deus têm? Certamente apenas conhecemos alguns e em certa medida, pois “no terrível abismo do Ser divino podem existir atributos dos quais não temos qualquer conhecimento e que não possuem significado algum para nós, assim como os atributos de misericórdia e graça não têm significado algum, pessoalmente, para os serafins ou querubins” (A.W. Tozer). O problema está em querermos reduzir a imagem de Deus à nossa própria imagem, limitando-o e tentando controlá-lo. Deus está muito acima do que a nossa visão ocidentalizada é capaz de compreender. Na verdade, quando reduzimos a imagem de Deus, no fundo é porque queremos controlá-lo! A. W. Tozer escreve que “a glória do Senhor não tem sido revelada a esta geração de homens. O Deus do cristianismo contemporâneo é apenas um pouquinho superior aos deuses da mitologia greco-romana, se não lhes for na verdade inferior, por ser fraco e incapaz, enquanto eles pelo menos tinham poder”.

O grande problema está na forma como vemos Deus, que foi deturpada com o pecado, pois o homem que fora criado à Sua imagem e semelhança, agora tenta inverter essa ordem, tentando pintá-lo como sua própria imagem. Daí surgem as perversões e desvios, pois acabamos vendo-O de acordo com as nossas próprias feridas e limitações diversas que têm o seu clímax na forma mais grotesca e abominável de todas: a idolatria. A. W. Tozer diz que “o coração idólatra entende Deus de maneira diferente do que Ele realmente é – isto, em si, já constitui pecado horrendo – e substitui o verdadeiro por um Deus feito à sua imagem. Este Deus sempre se conformará com a imagem daquele que o concebe…”. Por acaso isso não está de acordo com Romanos 1.23, que diz: “e mudaram a glória do Deus incorruptível em semelhança da imagem de homem corruptível, bem como de aves, quadrúpedes e répteis”. Tozer segue dizendo: “Um deus gerado nas sombras de um coração decaído, não poderá naturalmente ser a imagem do Deus Verdadeiro”.

A palavra “transcendência” vem do latim, transcendere, que significa “cruzar uma fronteira”. Quando me refiro acerca da “transcendência do avivamento” tento ao menos admitir que essa realidade está além da minha imaginação e mediocridade, pois estar ligando à natureza de Deus. Não quero, portanto, aventurar-me a conjecturar fatos que tem mais a ver com cognição, mas admitir a possibilidade de algo muito superior ao que a minha mente pode conceber.

Uma forma limitada de ver o avivamento

Por anos tenho ouvido mensagens e lido livros que tratam de como o avivamento transformará a vida da igreja atual, tirando-a da sua liturgia morta e colocando-a numa vida pulsante e vibrante onde os crentes experimentarão um gozo indescritível. Por muitas vezes tenho pregado sobre como Deus deseja derramar-se no meio do Seu povo, curar, libertar e salvar o pecador, afinal de contas, desde as páginas de Atos dos Apóstolos ate aos dias de hoje, os maiores reavivamentos da história têm demonstrado essas marcas. Creio profundamente que essas realidades compõem o avivamento, mas não podem ser caracterizadas como a totalidade do mesmo.

Descobri que a minha maneira de ver o avivamento tão esperado e profetizado nas Escrituras é, na verdade, uma visão que abrange apenas o aspecto “religioso”. O sonho de ver uma realidade confinada às quatro paredes é um sonho medíocre e egoísta, pois enquanto atinge um grupo específico, exclui outros. Joel profetiza e Pedro confirma que “derramarei do meu Espírito sobre toda a carne(Atos 2.17). Isso fala de um avivamento inclusivo, ou seja, de algo que tocará todas as pessoas e todos os seguimentos da sociedade. A expressão “toda a carne” ou “toda carne”, nas Escritures, refere-se ao homem sem distinção alguma ou a todos os seres viventes (Gênesis 6.13; 9.15; Deuteronômio 5.26; Jô 34.15; Salmo 145.21; Isaías 40.5; 66.23). Baseado nessa verdade universal, não posso entender “toda a carne” como sendo somente a “carne dos judeus”,ou a “carne dos cristãos”, ainda que esse derramar do Espírito seja em diferentes medidas e em diferentes realidades. Essa verdade requer de mim o rompimento com alguns preconceitos e ideologias que segrega o avivamento a uma classe privilegiada de religiosos. Não estou aqui trazendo conceitos universalistas, pois creio que não há salvação fora de Jesus (Atos 4.12; 1Tióteo 2.5), mas creio que Deus “faz nascer o seu sol sobre maus e bons e vir chuvas sobre justos e injustos” (Mateus 5.45). Apesar da queda do homem e a imagem de Deus desfigurada neste, esta imagem não foi totalmente destruída. Essa condição permite que a obra de redenção resgate o homem e restaure a ordem na criação.

Quando pensamos em avivamento, ligamos essa realidade a um contexto restrito e usamos um vocabulário próprio, um “dialeto evangélico”, excluindo, dessa forma, o restante do mundo. É muito importante entendermos a transcendência do avivamento para buscarmos algo que possa marcar profundamente a ordem das coisas.

A declaração da mulher samaritana a Jesus resume muito bem o pensamento religioso que limita a revelação de Deus a “toda carne”: “Nossos pais adoravam neste monte; vós, entretanto, dizeis que em Jerusalém é o lugar onde se deve adorar” (João 4:20). Porque tendemos a confinar Deus numa casa, num monte, numa terra, numa denominação, numa liturgia, num linguajar etc? O que nos faz pensar que Aquele que “habita em luz inacessível” (1Timóteo 6.16) satisfará aos nossos caprichos ridículos? Se queremos experimentar um avivamento abrangente, devemos admitir algumas possibilidades que não existiam em nossas mentes limitadas:

Cruzando fronteiras

Na história do texto que citamos como base dessa reflexão, o profeta Elias, conhecido por trazer um poderoso avivamento na Nação israelita, tem uma lição inesperada que precisamos aprender também: Elias se lamentava pela forma como a Nação havia sido entregue à idolatria e apostasia. Manifestava seu descontentamento diante de Deus que logo mostrou que o profeta estava se deixando levar por autocomiseração. Elias disse: “…Tenho sido em extremo zeloso pelo SENHOR, Deus dos Exércitos, porque os filhos de Israel deixaram a tua aliança, derribaram os teus altares e mataram os teus profetas à espada; e eu fiquei só, e procuram tirar-me a vida” (1 Reis 19:14)Essa visão distorcida de entender o mover de Deus, acabou confinando o profeta ao seu “mundinho” de auto piedade, fazendo-o achar que somente ele estava certo – então Deus lhe diz: “Também conservei em Israel sete mil, todos os joelhos que não se dobraram a Baal, e toda boca que o não beijou” (1 Reis 19:18).

Há uma grande diferença de um para sete mil! A visão exclusivista de Elias o cegou para o fato de que Deus havia conservado um exército de pessoas fiéis que mantiveram sua fé intacta. Elias aprendeu que a obra de Deus vai além da sua capacidade de enxergar as coisas. Daí segue-se uma ordem no mínimo intrigante: “…Unge a Hazael rei sobre a Síria. A Jeú, filho de Ninsi, ungirás rei sobre Israel e também Eliseu, filho de Safate, de Abel-Meolá, ungirás profeta em teu lugar” (1Reis 19.15b,16).

Na ordem de Deus a Elias, podemos ver a amplitude do avivamento em relação ao seu alcance. (1) Hazael deveria ser ungido rei sobre a Síria – isso nos fala do plano de Deus para com as nações, pois Ele não é um deus tribal, restrito ao a uma comarca geográfica, mas é o “Rei das nações” (Jeremias 10.7; Apocalipse 15.3) e “é ele quem muda o tempo e as estações, remove reis e estabelece reis; ele dá sabedoria aos sábios e entendimento aos inteligentes” (Daniel 2:21). O plano profético de Deus inclui todas as nações da terra, portanto não podemos admitir a idéia de uma nação preferida ou que detém a prerrogativa das bênçãos. Deus usa, em sua soberania, os governos da Terra para estabelecer os Seus desígnios. (2) Em seguida Deus ordena que Jeú seja ungido rei sobre Israel – aqui está o plano nacional de Deus, levantando governantes que executem Sua vontade, conduzindo, dessa forma, a história da humanidade à consumação de todas as coisas. (3) Deus também estabelece que Elias levante Elizeu como seu sucessor, garantindo, dessa forma, que a Nação teria direção espiritual para conduzir-se na vontade dEle.

Esses dois níveis de autoridade, civil e “eclesiástica”, garantem que a ordem seja mantida e que cada “ministro” opere na sua esfera de ação, mas agindo em conjunto a fim de executar a vontade divina: “Quem escapar à espada de Hazael, Jeú o matará; quem escapar à espada de Jeú, Eliseu o matará”(1 Reis 19:17). Ainda que a espada do governo e da lei falhem, temos a espada da palavra profética.

Por:. Marcos Arrais

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